passeio dentro de ti

nesta cidade, muito guarda-segredos e cantinhos rarefeitos. inacessíveis. na pele colada de balões e bailarinas..
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a little boy 
follows a butterfly
and ends up 
finding 
a beautiful bike
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noite. uma sala pequena.no meio, à mesa, debaixo da luz, estão sentadas duas crianças em frente uma da outra, inclinadas a contragosto sobre os seus livros. estão ambas longe- longe. os livros escondem os seus voos. de vez em quando chamam-se, para não se perderem na longínqua floresta dos seus sonhos. experimentam, na exígua sala, destinos fantásticos e coloridos. lutam e vencem. regressam a casa e casam.
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[rainer maria rilke_notas sobre a melodia das coisas]

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29 de abril
há dias que ficam tatuados na pele.
palavra dos impossíveis.
beijo

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drowning my thoughts
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fumo um cigarro nu a teu lado, cabelo em desalinho, corpo amarrotado, lençóis pisados ao fundo da cama, peças de roupa espalhadas no chão, fome alucinada que tudo devorou. não quero partir, não quero ficar, tão pouco tenho pressa de o perguntar. estou bem onde estou, junto do teu corpo, copos manchados de cuspo e dedadas. tinha-te dito à chegada, enquanto te enchia o copo: separa-nos uma e um quarto de luís pato (unidade de medida astronómica). à nossa. disse-te e batemos os copos. digo-te agora: separa-nos cada passo de cada dia percorrido (unidade de medida terrestre). o caminho a todo o comprimento e largura. máscaras, disfarces, medo, meias palavras. para quê vestir-me?
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[jorge roque & guilherme faria_uma e um quarto de luis pato in broto sofro]
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 borboletas na barriga
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escuta o contrabaixista. tudo o que ele cala. tudo o que tenta dizer e não consegue (tudo o que diz porque não consegue). escuta. na orla do silêncio que vibra, corda a corda percutida, a minha vida.
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[jorge roque & guilherme faria_contrabaixista in broto sofro]
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bo-ni-to!
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+..+.. +..+
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just what it takes
to understand
the consequence
a cigarette
for a long way
upstairs
forever places are
easy to say,
impossible to be
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our place
is just behind the
waiting line
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we met at the sea where landscape both tends to fall and renews
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caminho pela rua em algodão doce
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a estrela
no meio das nuvens
julga que está sozinha
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[yvette centeno_de frente para o mar]

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as areias perdem-se
no mar: regressam à praia
cavalos de água
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[casimiro de brito_de frente para o mar]

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as gaivotas
calam-se
perante o silêncio
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[dinis lapa_de frente para o mar]

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porque é que os peixes
dormem
de olhos abertos?
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[albano martins_de frente para o mar]

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ouves o mar?
e o vento? e as gaivotas?
- é o silêncio
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[david rodrigues_de frente para o mar]

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brincam na areia
para cá e para lá –
cão e sombra
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[lécio ferreira_de frente para o mar]

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agarrar a lua
e atirá-la
ao mar?
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[yvette centeno_de frente para o mar]

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tarde de inverno:
ainda voam as gaivotas
e os guarda-chuvas
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[luis domingos_de frente para o mar]

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nortada –
os farrapos de espuma
fogem para o sul
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[david rodrigues_de frente para o mar]

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rasa à água
a gaivota voa presa
à sua sombra
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[lécio ferreira_de frente para o mar]

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na luz do farol
uma gaivota cintila.
ou será um anjo?
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[luis domingos_de frente para o mar]

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rocha vermelha
um coração a pique
sobre o mar
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[yvette centeno_de frente para o mar]

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..aprender a ler
a caligrafia das algas
na maré vazia..
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[luis domingos_de frente para o mar]

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carrego na mão
uma gota de água
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[dinis lapa_de frente para o mar]

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pequeno aquário
um peixe
atravessa o vidro
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[dinis lapa_de frente para o mar]

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pupille absente, iris absinthe, baby doll,
elle en est folle
tout en jouant avec son zip
a entrebâiller ses "levi's"
lorsqu'en un songe absurde marilou se résorbe
que son coma l'absorbe en pratiques obscures
subrepticement se teinte de plaisirs sans l'attente
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ma débile mentale perdue en son exil physique et cérébral
mon alice
au pays des malices de lewis carroll
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imensamente nos deitamos um no outro
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[vasco gato_um mover de mão]
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because trees can fly
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olhando sobre as ruas da cidade em coma, encontrava um ritmo alucinante. e a candura dos lugares invisíveis. irrepetíveis. em baixo era o medo e eu tinha os braços mordidos pelo silêncio fantástico das vidas intactas. as gargantas da noite respiram indiferentes ao dilema da queda. o mistério não pede que o expliques. pôr a mão dentro de um corpo seria invadir um calor sagrado, frágil, desenhado a giz, arrancado ao ar. um corpo assim não se deve possuir, mas escutar, escutar. deve haver música no interior de um corpo.
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[vasco gato_imo (adapt.)]
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walked on
frozen glass
with velvet feet
watched my
heart grow
in your hands
and i scream
as angels cry
with loud loud tears
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bem coladinho na pele
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de entre todas as viagens, as que mais gosto são aquelas que requerem um ritual minucioso. listas de residenciais. ligar a saber da cor das cortinas – verdes de algodão? - , se servem compota ao pequeno-almoço, se a paisagem dá para alguma estátua de anjos, se o barulho dos carros embala ou desperta. casa-de-banho branca, mosaicos, toalhas de um azul.. reservar, por favor. e retirar dos olhos as pedras dos dias comuns. inaugurar os cabelos ao novo sol que só o das distâncias. de entre as viagens, as de dobrar a roupa com cheiro a soflan, a mala quadrada e os espelhos mínimos. dispersos. depois, os bilhetes dobrados até à exaustão e um livro e as músicas desde a estação de partida até à chegada. a incandescência de um comboio a arder.
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[ana salomé_anáfora (adpt.)]
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manual de como descalçar sabrinas a meninas
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fumei pelas ruas com as pontas dos dedos queimados. quem me visse com sabrinas vermelhas e a fumar não me reconheceria. destoante. sentei-me num dos bancos verdes, os meus pés não tocavam no chão. baloiçavam-se. as sabrinas descaíram até à ponta dos pés. as meias escorregaram. do joelho para baixo, as minhas pernas aparentavam-se com duas línguas espessas. lambiam o vento. era doce. quando descalçares sabrinas terá de ser com procedimentos cinderélicos. [na] minuciosa anatomia de quem quer andar como quem [voa].
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[ana salomé_anáfora (adapt.)]
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o teu cabelo
a tua testa
os teus lábios
o teu pescoço
o teu peito
o teu ventre
o teu labirinto
e o princípio do abismo
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as tuas coxas
os dedos dos teus pés
um a um
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[abel murcia_em voz baixa]
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bonito 
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the cherry on my cake
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